Quinta-Feira, 21 de novembro de 2024
Justiça no Interior

Intimação na era digital – Marcelo Cintra Zarif

É inquestionável que o uso de recursos tecnológicos  trouxe grande avanço para o mundo civilizado,  especificamente no âmbito do direito e, em particular, dos processos judiciais, representando hoje um avanço incomensurável.

Contudo, a velocidade na incorporação das modernas ferramentas que permitem substituir o físico pelo virtual demanda o adequado acompanhamento no que concerne ao respeito das garantias constitucionais e ao direito de todos os cidadãos.

No que tange às intimações, que se processam no transcorrer do processo, ocorrem fatos que exigem nossa atenção e cuidado para que essas garantias não sejam atropeladas.

Fiel a esses novos tempos, dispõe o artigo 270 do vigente código de processo civil que “as intimações realizam-se, sempre que possível, por meio eletrônico, na forma da lei”.

A lei que regulou a questão é a 11.419, de 19 de dezembro de 2006, que em seu artigo 5º. Estabelece que “as intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do artigo 2º desta lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônica.”

Ademais, estabeleceu que a data de início do prazo é aquela em que o intimado acessar o sistema e tomar conhecimento do teor da intimação e, mais, que se não for o sistema acessado no período de 10 dias, a intimação considera-se feita ao final desse prazo.

Em outras palavras, dispensou-se o Judiciário de efetuar essas intimações em um Diário Oficial Eletrônico, como ainda acontece na Bahia, por exemplo, e criou para as partes, e seus advogados, a obrigação de entrar constantemente nos diversos portais, utilizadas pelo Poder Judiciário, em seus diferentes órgãos,  para saber se existe alguma publicação de seu interesse.

O ônus é insuportável em  razão da quantidade de tribunais  do país que já adotaram a publicação em sistemas próprios, prescindindo da publicação em diário eletrônico, dentre os quais são mais conhecidos o PJe, o PROJUDI e o e- SAJ, além do e-PROC (TRF-4), o TUCUJURIS (TJ-AP) e o APOLO (TRF-2), que ainda se subdividem entre as cortes superiores, federais, estaduais e trabalhistas. É possível alcançar uma média nacional de 100 (cem) portais que deverão ser acessados diariamente pelo advogado que atua em âmbito nacional.

A título de exemplo, só no âmbito estadual, o TJ/BA utiliza o PJe (1º), PJe (2º),  o PROJUDI, todos eletrônicos, além do e-SAJ e o famigerado SAIPRO. Na esfera federal, ainda há, no TRF da 1ª Região, o portal do PJe (1º) e do PJe (2º), ambos eletrônicos.

Ou seja, seguida ao pé da letra essa norma, o advogado militante teria que, diariamente, acessar, no mínimo, todos os 5 (cinco) sistemas eletrônicos, além do sistema próprio da Justiça do Trabalho, a fim de evitar a certificação de decurso de todo e qualquer ato processual não publicado.

Não raro, cada uma dessas plataformas exige diferentes configurações de computador, downloads de aplicativos diversos (ex: Java, Shodô, webSigner, icpBravo, PJE-Office etc) e utilização de navegadores específicos.

Para evitar tamanho caos, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 234/2016 e instituiu o Diário de Justiça Eletrônico (DJEN) como instrumento de publicação dos atos dos órgãos do Poder Judiciário.

Esse DJEN que representa a superação de todos os problemas antes apontados, no entanto, não foi implantado, em que pesem os já mais de 4 anos decorridos desde a edição da Resolução.

Essa mesma Resolução previu que até que seja implantado o DJEN, as intimações dos atos processuais sejam realizadas via Diário de Justiça Eletrônico (DJE) do próprio órgão.

Como destacado, aqui na Bahia, na Justiça Estadual, não é sentido ainda o problema porque os atos são publicados no DJE, contudo, a questão começa a surgir no TRF da 1ª. Região e já é muito sério em outras localidades como Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, impondo a necessidade de adoção de providências.

Na mesma esteira de problemas que dificultam o exercício da advocacia, não tem sido cumprida uma regra simples e objetiva que muita auxiliaria o bom exercício desse mister. A efetivação das intimações à sociedade de advogados e não aos integrantes dessa,  ou aqueles que dela  participam na qualidade de associado ou contratado.

Em boa hora, atendendo ao crescimento cada vez maior dessas sociedades, o artigo 272, parágrafo 1º estabeleceu que “os advogados poderão requerer que, na intimação a eles dirigida, figure apenas o nome da sociedade a que pertençam, desde que devidamente registrada na Ordem dos Advogados do Brasil”.

Essa providência, desde que requerida, elimina uma outra dificuldade prática que diz respeito à pesquisa em nome de elevado número de advogados que integrem uma procuração, incluindo-se aqueles advogados que já não mais participam daquele processo por terem se desligado da sociedade.

No entanto essa prática não vem sendo observada pelo Judiciário que, sob os mais diferentes pretextos, evita fazer as publicações em nome das sociedades de advogados.

Eis aí duas questões relativamente simples de se resolver, mas que causam enormes prejuízos aos profissionais da advocacia e que desafiam uma ação mais enérgica da OAB na defesa desses legítimos interesses.

Marcelo Cintra Zarif

Graduado pela USP, especialista em Direito processual Civil pela PUC- SP, Ex-Conselheiro Federal da OAB pela Bahia, advogado há mais de 40 anos, com larga experiência nas áreas do direito Civil, Consumidor, Educacional e Público.


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