Foto: MPT
Por: Justiça no Interior
17 pessoas já foram resgatadas em condições análogas a escravidão na Bahia durante fiscalizações de Trabalho Escravo realizadas por Auditores-Fiscais do Trabalho até o dia 13 de maio de 2022. Os dados constam no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, disponibilizado pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Previdência.
O município de Santa Luzia, região sul do estado, está no topo do ranking negativo. Dos 17 resgatados pelos Auditores do Trabalho, 16 foram encontrados em uma fazenda da cidade.
Durante a ação fiscal, no mês de abril, foram encontradas 15 pessoas atuando na extração de fibras de piaçava e uma na criação de gado. Todas elas sem registro de contrato de trabalho em carteira e sem contar com as mínimas condições de dignidade para desenvolver suas atividades produtivas. Se encontravam com péssimas condições de vida, moradia e trabalho. Dentre os que atuavam na extração de piaçava, havia ainda um jovem de 14 anos.
Parte do grupo não contava sequer com alojamento e pernoitava no meio da mata, em barracos de lona. Outros trabalhadores e o vaqueiro viviam em dois casebres de madeira, na sede da fazenda, com mínimo conforto.
Foto: Reprodução/Ministério do Trabalho
Também chamou atenção o caso de uma mulher de 52 anos, identificada pelas iniciais M. S. S., resgatada em Vitória da Conquista, no sudoeste baiano, depois de permanecer por quatro décadas trabalhando como doméstica em uma pensão estudantil da cidade.
A vítima contou aos Auditores que começou a trabalhar para a patroa quando tinha apenas 12 anos. Na época, ela morava numa fazenda em Ubaitaba, no sul baiano, e o pai concordou em deixar a filha seguir com a empregadora para Itabuna, onde ela residia naquela época.
Nos primeiros anos, M. S. S. ainda tinha contato com o pai, que a visitou algumas vezes, mas com a mudança da patroa para o município de Vitória da Conquista esse contato se rompeu.
Foto: Reprodução/MPT
“Com certeza, há uma subnotificação”, afirma procuradora Manuella Gedeon, coordenadora de combate ao trabalho escravo do MPT na Bahia
Segundo o Ministério do Trabalho e da Previdência, o trabalho em condições análogas à escravidão é caracterizado quando o ser humano é submetido: a trabalhos forçados; a jornada exaustiva; a condições degradantes de trabalho; a restrição da locomoção do trabalhador; a vigilância ostensiva no local de trabalho por parte do empregador ou seu preposto e a posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.
Longe de ser uma página virada na nossa história, como mostram os dados e as histórias expostas acima, as condições a que os trabalhadores são submetidos em alguns locais da Bahia, trazem preocupação a procuradora Manuella Gedeon, coordenadora de combate ao trabalho escravo do MPT na Bahia.
Em entrevista ao Justiça no Interior, concedida na quarta-feira, 01, ela aponta que pode haver uma subnotificação nos casos de trabalho escravo na Bahia, uma vez que o combate é feito a partir de denúncias. “A fiscalização age através de denúncias, muito embora haja também uma busca ativa realizada pelo Ministério do Trabalho, pelo Ministério Público. Mas os casos mais comuns, as equipes se organização através de denúncias e sim, com certeza, há uma subnotificação e nem tudo chega ao nosso conhecimento, considerando a extensão do nosso estado.
Foto: Arquivo Pessoal
O trabalho de combate ao trabalho escravo é feito por meio de forças tarefas compostas por órgãos como a Comissão Estadual de Combate ao Trabalho Escravo da Bahia (Coetrae-BA), o Ministério Público do Trabalho (MPT), auditores-fiscais do Ministério do Trabalho e Previdência Social, a Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS), a Defensoria Pública da União (DPU) e as Polícias Federal e Rodoviária Federal.
“É uma força tarefa que é organizada a partir das denúncias para que a gente vá até o local e verifique a situação. A denúncia pode ser feita através do site www.prt5.mpt.mp.br. Pode ser sigilosa, anônima, mas é necessário que tenha as informações para a gente mobilizar a equipe e ir até o local denunciado”, afirma a procuradora.
O empregador que for encontrado explorando trabalhadores em condições análogas à escravidão pode pegar uma pena de reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente, se houver violência. “Além da esfera penal, a gente busca uma responsabilização civil-trabalhista, inclusive esse é o foco do Ministério Público do Trabalho, que é ajuizar ações ou firmar Termos de Ajuste de Conduta prevendo pagamento de indenizações trabalhistas passadas, todas as verbas rescisórias, indenização por danos morais individuais, multas, etc.”, conclui Manuella Gedeon.
Por conta do trabalho do MPT, a juíza Vivianne Tanure Mateus, titular da 2ª vara do Trabalho de Salvador, bloqueou bens no valor de R$ 1 milhão para garantia das verbas rescisórias e dos danos morais a serem pagos à doméstica Madalena Silva, de 62 anos, que foi resgatada por auditores-fiscais do Ministério do Trabalho e Previdência após trabalhar 54 anos em uma residência no município de Lauro de Freitas, região metropolitana de Salvador.
Foto: Reprodução/TV Bahia
Durante esses anos, Madalena nunca recebeu salários nem qualquer outra forma de pagamento e foi expulsa pela filha dos patrões da casa em que morou para passar a viver à própria sorte. O caso chegou ao conhecimento do MPT pela vítima, que, instruída por populares, fez denúncia na sede do órgão no fim de dezembro de 2021.